Pele Tecido - Espacialidade sonora e virtualidades
Giovana Adoracion
A trilha sonora original de Pele Tecido é tecida de forma a participar da grande collage que compõe a performance cênica, como um outro elemento que auxilia na "vestimenta" destas poesias. A trilha não tem uma pretensão de destacar-se do espetáculo como a parte sonora do mesmo. Na verdade, ela segue uma lógica anti-musical, de forma a dar uma cor, uma forma à cena. As percepções exploradas, ao buscar esta sonoridade para o espetáculo, são muito mais espaciais e sensoriais; são visualmente virtuais, uma vez que o som busca, em prática, gerar uma ambientação, ritmo e funciona como uma espécie de padronagem dada a cada cena, pois sua composição e produção utilizam loops com esse objetivo sensorial.
Justamente um tecido. Um tecido sonoro, porque pode ser reconhecido em um fluxo que persegue este mesmo local imaginário aonde ocorrem os poemas. Qual som existe nos ambientes em que nenhum som pode ser controlado? Qual é o som do universo, por exemplo? E de lá, de onde nada ainda era nada, e o sol já era sol, porém sem nome? Aonde o chão era chão, mas sem nome. O som era som, como dito no prólogo de Pele tecido. Não há uma cronologia clara observada nos poemas, mas pode-se estabelecer uma costura entre os temas que se repetem, com diferentes perspectivas de um mesmo assunto talvez. Eu os vejo fazendo sentido dentro deste espaço virtual, onde se encontram os anseios e desejos, mas também contendo o cotidiano, visto por olhos gulosos que nada querem perder na percepção.
Os loops também surgem com a ideia do recomeço constante, imagem que é sempre reafirmada no livro, de diferentes formas - "todo dia é o dia 1". Imagem que vem com este tecido de infinitas infinidades, uma dentro da outra, gerando seus próprios ritmos e melodias orgânicas, que se alternam nas faixas da trilha entre células que possuem perfeita métrica e divisão na mudança de um acorde a outro e de uma nota para outra também. E outras faixas que, propositalmente, gostariam de romper o espaço virtual do ambiente, mas lançando mão do recurso da quebra do tempo e da ideia de uma harmonia e melodia - esta é a primeira faixa. O prólogo.
Em algumas músicas, as quebras na expectativa são as marcas da humanidade impressa no trabalho. Como se, comparando à ideia da imagem, existisse música realista e música não-realista. De fato, a música contemporânea é extremamente diferente da música clássica, mas nenhuma das duas é considerada "mais fiel à realidade ou não" e, no caso desta trilha, é exatamente isso. As músicas desenvolvidas neste processo de absorção e releitura da poesia de Ericson, em forma de som, geram em mim, enquanto artista, justamente a necessidade de colocar o sentido em signos anti-musicais. Atuando dentro da realidade da performance enquanto um de seus elementos, como um cenário ou figurino, a música é colocada entre os performers e objetos de cena como um elemento que também tem sua espacialidade. Mas ela se dá virtualmente, no espaço da mente.